terça-feira, março 25, 2008

Being a wiseguy


"You mean, let me understand this cause, ya know maybe it's me, I'm a little fucked up maybe, but I'm funny how, I mean funny like I'm a clown, I amuse you? I make you laugh, I'm here to fuckin' amuse you? What do you mean funny, funny how? How am I funny?"
- Tommy DeVito em Goodfellas

quinta-feira, março 20, 2008

Um fotógrafo amigo


Havia me esquecido de postar este link aqui. É um pequeno portfolio do fotógrafo (e grande amigo!!) João Urban. Se deliciem com suas imagens da imigração polonesa no Paraná! E aproveitem para dar uma voltinha no simpático site da Lúcia Guanaes onde ele está hospedado.
Essa foto não está no ensaio, mas eu coloquei-a aqui pois tive a oportunidade de assistir à sua produção! :)

terça-feira, março 04, 2008

A Lavoura Arcaica

“Saltei num instante para cima da laje que pesava sobre meu corpo, meus olhos de início foram de espanto, redondos e parados, olhos de lagarto que abandonando a água imensa tivesse deslizado a barriga numa rocha firme; fechei minhas pálpebras de couro para proteger-me da luz que me queimava, e meu verbo foi um princípio de mundo: musgo, charcos e lodo; e meu primeiro pensamento foi em relação ao espaço, e minha primeira saliva revestiu-se do emprego do tempo. Todo esse espaço existe para um passeio, passei a dizer, e a dizer o que nunca havia sequer suspeitado antes, nenhum espaço existe se não for fecundado, como quem entra na mata virgem e se aloja no interior, como quem penetra num círculo de pessoas em vez de circundá-lo timidamente de longe. E na claridade ingênua e cheia de febre logo me apercebi, espiando entre folhagens suculentas, do vôo célere de um pássaro branco, ocupando em cada instante um espaço novo; pela primeira vez senti o fluxo da vida, seu cheiro forte de peixe, e o pássaro que voava traçava em meu pensamento uma linha branca e arrojada, da inércia para o eterno movimento. E mal saindo da água do meu sono, mas já sentindo as patas de um animal forte galopando no meu peito, eu disse cegado por tanta luz tenho dezessete anos e minha saúde é perfeita e sobre esta pedra fundarei minha igreja particular, a igreja para o meu uso, a igreja que freqüentarei de pés descalços e corpo desnudo, despido como vim ao mundo, e muita coisa estava acontecendo pois me senti num momento profeta da minha própria história, não aquele que alça os olhos pro alto, antes o profeta que tomba o olhar com segurança sobre os frutos da terra, e eu pensei e disse sobre esta pedra me acontece de repente te querer, e eu posso! Vendo o sol se enchendo com meu sangue antigo, retesando os músculos perfeitos, lançando na atmosfera seus dardos de cobre sempre seguidos de um vento quente zunindo nos meus ouvidos, me rondando o sono quieto de planta, despenteando o silêncio do um ninho, me espicaçando o couro nas pontas da sua luz metálica, me atirando numa súbita insônia ardente, que bolhas nos meus poros, que correntes nos meus pêlos enquanto perseguia fremente uma corça esguia, cada palavra era uma folha seca e eu nessa carreira pisoteando as páginas de muitos livros, colhendo entre gravetos este alimento ácido e virulento, quantas mulheres, quantos varões, quantos ancestrais, quanta peste acumulada, que caldo mais grosso nesse fruto da família! eu tinha simplesmente forjado o punho, erguido a mão e decretado a hora: a impaciência também tem os seus direitos!”

Capítulo 14 de A Lavoura Arcaica

sábado, março 01, 2008

A "auto-ajuda" do Instante Decisivo

"Alguém entra repentinamente no seu campo de visão. Você começa a seguir essa pessoa através do visor da câmara. Você espera, espera, e finalmente aperta o disparador - e sai com a sensação - embora não saiba exatamente por quê - de que realmente pegou alguma coisa".
Henri-Cartier Bresson no ensaio “O Instante Decisivo”


Henri Cartier-Bresson, grande fotógrafo francês, gostava de fotografar com uma câmara Leica, com uma objetiva 50 mm. Um bom campo de visão, lentes cristalinas – as melhores que há – a praticidade do filme 35mm e o límpido visor telemétrico fazem dela uma câmara praticamente perfeita. Contudo, a escolha de Bresson tinha muito a ver também com aparência: a Leica é pequenina, tem um design simples, é uma câmara discreta. Com ela, ele podia sair pelo mundo e clicar sem ser notado, sem gerar frisson, interferindo o mínimo na cena, como era desejo dele.
Algo inesperado, um instante único, uma combinação de sombras, luzes, rostos. Uma pequena confusão, um vulto a passar, uma melancólica caminhada, uma cena de amor, amizade, devastação, solidão, degradação. O mendigo olha para o gato no beco, Sartre fuma um cachimbo, o homem olha através do vidro da janela do restaurante pensando - quem sabe! - em tempos antigos. Cenas que duram minutos, segundos, décimos, milésimos de segundo. E que, com sua Leica, Bresson capturava com os pequenos tempos do obturador.
A foto que ilustra esse texto mostra um desses instantes. As pessoas que dela fazem parte – somam cinco – formam um jogo geométrico que só um fotografo de olhar preciso e sensível como o de Cartier-Bresson conseguiria enxergar. A intrincada construção torna-se leve com a presença dos elementos nos exatos locais onde estão colocados, nem um milímetro a mais, nem um a menos, o que o fotógrafo mesmo chama de “equilíbrio imóvel”. A impressão que tenho é a de que ele anteviu a direção para que seguiam aquelas pessoas e aguardou o instante único em que, ao olhar dele, as pessoas estariam na localização perfeita para uma boa foto. E isso é o “instante decisivo”.
O momento da fotografia – clicada em Istambul no ano de 1965 - durou um tempo minúsculo mas se fixou para sempre no negativo preto-e-branco colocado dentro da Leica. E assim por diante, foi fixado no papel dentro de um laboratório, pendurado na parede, impresso em livros, catálogos, digitalizado. Hoje com um clique (de milésimos de segundo também) a encontro no google. Uma específica escolha de abertura, tempo, enquadramento, luz e, principalmente, a escolha do momento do clique fez de uma foto um clássico instantâneo.
O interessante nesta reflexão que Cartier-Bresson fez da fotografia é que ela vale para todos os setores da vida. As escolhas que fazemos, os caminhos que tomamos, as coisas que falamos podem mudar o curso de nossas histórias. São resultados irrevogáveis como as manchas que a luz provoca na prata do filme. A vida está repleta de instantes decisivos, impossíveis de se apagar. Devemos aproveitá-los, apreciá-los e refletir sobre eles o tempo todo. Contudo, como o próprio Bresson afirma, no ensaio, não podemos só pensar na composição, digo, nas conseqüências. Devemos deixar a intuição nos dizer o que fazer, para analisar tudo depois, com calma, no escuro do laboratório, ou melhor, na quietude de nossas mentes.

Ah! Um ensaio fotográfico que fiz foi publicado no Comunicação On-line. Confira aqui.